Solange não gostava de sol, embora estivesse lá todos os dias, sentada naquela cadeira de plástico, em meio às plantas. Já não lembrava como foi parar ali e porque ali estava. Naquele horário, o sol não queimava, apenas aquecia.
Ela poderia se levantar e voltar para dentro, mas ela não ia. Seu corpo não reagia. Não sabia como fazer isso, não sabia como se levantar e voltar. Para onde ela voltaria? Nem mesmo sabia onde estava, embora o lugar não lhe parecesse estranho.
Conseguia ver os muros, o puxadinho, as plantas, sentir a faixa de sol de todos os dias, perceber a porta lateral. De onde ela sabia que alguém sairia, alguém viria e a levaria para dentro, uma hora ou outra.
Era isso ou nada. Solange torraria ao sol. Sua pele já estava enrugada.
Ela conseguia perceber o que via. Entretanto, não sabia o que ficava para trás. Ela só olhava para frente, imóvel, sentindo o sol na pele, os braços no encosto da cadeira, os pés descalços no chão de cimento gelado, os olhos fixos.
Não, Solange não sabia o que ficava para trás. Não lembrava mais. Estava ali, só.
Mas ela sabia que não estava sozinha. Ela sentia. Atrás estava o portão, a rua. Contudo, ela não via. As pessoas que passavam dificilmente deixavam de notar aquela figura através das grades finas. Exposta numa manhã de sol fria. Esperando por algo. Ela, que já fora um sol um dia.
Alice Silva é de Manaus, Amazonas. Tem 27 anos. É graduada em Letras – Língua Portuguesa pela UEA, Universidade Federal do Amazonas, e mestranda em Letras e Artes, também pela UEA. Não vive mais de esperanças nem tem amor-próprio, mas ainda escreve. É uma das editoras da Revista Torquato.